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Missa Negra (trecho)

Do livro a Ditadura Envergonhada,
do jornalista e escritor Élio Gaspari,
às páginas 343 a 341:

Às dezessete horas da sexta-feira, 13 de dezembro do ano bissexto de 1968, o marechal Arthur da Costa e Silva, com a pressão a 22 por 13, parou de brincar com as palavras cruzadas e desceu a escadaria de mármore do Laranjeiras para presidir o Conselho de Segurança Nacional, reunido à grande mesa de jantar do palácio. Começava a missa negra.

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O presidente abriu a sessão com um discurso em que se denominou “legítimo representante da Revolução de 31 de março de 1964” e lembrou que com “grande esforço […] boa vontade e tolerância” conseguira chegar a “quase dois anos de governo presumidamente constitucional”. Ofereceu ao plenário “uma decisão optativa: ou a Revolução continua ou a Revolução se desagrega”. Batendo na mesa, anunciou que “a decisão está tomada”.

(…)

Horas mais tarde, Gama e Silva anunciou diante das câmeras de TV o texto do Ato Institucional no. 5. Pela primeira vez desde 1937 e pela quinta vez na História do Brasil, o Congresso era fechado por tempo indeterminado. O Ato era uma reedição dos conceitos trazidos para o léxico político em 1964. Restabeleciam-se as demissões sumárias, cassações de mandatos, suspensões de direitos políticos. Alem disso, suspendiam-se as franquias constitucionais da liberdade de expressão e de reunião. Um artigo permitia que se proibisse ao cidadão o exercício de sua profissão. Outro patrocinava o confisco de bens.

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A pior das marcas ditatoriais do Ato, aquela que haveria de ferir toda uma geração de brasileiros, encontrava-se em seu artigo 10: “Fica suspensa a garantia de hábeas corpus nos casos de crimes políticos contra a segurança nacional”. Estava atendida a reivindicação da máquina repressiva.

(…)

Três meses depois da edição do AI-5, estabeleceu-se que os encarregados dos inquéritos políticos podiam prender quaisquer cidadãos por sessenta dias, dez dos quais em regime de incomunicabilidade. Em termos práticos, esses prazos destinavam-se a favorecer o trabalho dos torturadores. Os dez dias de incomunicabilidade vinham a ser o dobro do tempo em quem a Coroa portuguesa permitia pelo alvará de 1705. Estava montado o cenário para os crimes da ditadura.