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Presépio

Dia claro que logo se fez noite.

Andava por ruas estreitas, de uma cidade antiga. Iguais a tantas que conheci ao longo da minha solitária peregrinação, mundo afora. Não pude identificar exatamente onde estávamos. Éramos muitos e caminhávamos ao som do vento e da luz das estrelas que logo pontilharam naquele céu rasgado e aberto.

Quis descobrir quem eram aqueles senhores, de fisionomia austera e congelada,
os únicos a olhar o infinito e entender o rumo que a caravana tomava a cada passo.

Para onde iria toda aquela gente?

Por que estavam assim felizes?

Havia uma boa nova. Qual a boa nova?

Sentia-me – aliás, como sempre me senti – um forasteiro, perdido em mim mesmo e pelos lugares por onde andei. Minhas roupas pesadas protegiam-me
das lambadas de ar e do frio.

Eu apenas caminhava junto a outras pessoas, famílias, grupos. Íamos em silêncio e esparsamente. Não sabia ao certo como chegara ali. Sentia-me bem, no entanto. De bem com a vida, como há tempos não acontecia. Não havia temores. Não sabia bem o porquê, mas tinha a convicção de que eram do bem as pessoas que me cercavam. De certa forma, guiavam-me para uma celebração.

Atravessamos uma ponte sobre um riacho, cujas águas pareciam ter o formato e
o brilho artificial de um espelho. Mesmo àquela hora da noite, um pescador
de chapéu verde nos saudou:

— Sejam todos bem-vindos à morada do Senhor.

De repente, percebi: os muros da cidade ficaram para trás, perdiam-se na linha do horizonte. E uma estrela, que parecia ter cauda de cometa, projetava clarões de luz sobre uma gruta, abrigo de humildes viajantes.

Alguém lembrou que estávamos em época de festas e todas as hospedarias estavam ocupadas.

— Ninguém deu guarida à esta humilde família – comentou um pastor que trazia uma ovelha sobre os ombros. Que, me pareceu, seria ofertada a outros recém-chegados.

Só aí me dei conta de que era um privilegiado, pois amigos me deram abrigo: um leito para descansar o corpo moído de tantas jornadas, o pão para matar a fome que só o sonhar não saciava e o vinho para dar fim à sede e reverenciar o novo tempo.

Não era exatamente uma praça.

Mas, um descampado que cercava o abrigo, onde se podia avistar um senhor de barba e cabelos grisalhos e sua jovem esposa. Dividiam o pequeno espaço com um burrico – provável meio de transporte do casal – e uma vaca a mugir de quando em quando…

Além deles, havia uma criança ali – um bebê recém-nascido.

Por Ele estávamos ali.

Por Ele se fez aquela noite com sol.

Tornei a olhar a cidade distante e me encantei.

Fiquei mais em paz ainda com essa imagem e ao ver a alegria das pessoas que
se abraçavam e anunciavam “a boa nova”.

Todo esse regozijo parece ter inspirado inclusive o vento que se pôs a soprar melodioso.

Gostaria, mas não sei descrever o encantamento de todos. O olhar luminoso
das pessoas que se puseram a bailar suavemente.

Dei alguns passos para trás para sair daquele círculo de bem-aventurados. Não me sentia digno de…

Sempre fui só e nunca soube dançar.

Ouvi alguém cantar versos que diziam:

— De reinos distantes, magos virão para saudar o Rei dos Reis.

Todo aquele cenário embevecia-me.

Tive a sensação que tudo o que andei vida afora foi para estar ali naquele exato instante.

A felicidade banhou minha alma triste.

Da multidão, saiu uma moça que me procurou com os olhos. Veio em minha direção.

Tomei um susto porque a moça era você e eu não a conhecia. Mas, sabia que era você.

Estava de frente para mim enquanto todos rodopiavam sem nos ver.

Assim as únicas pessoas que existiam naquele mundo, verdadeiramente, éramos
nós dois. Você dava passos largos de bailarina, suaves, cadenciados pelo som e ritmo do vento.

Fiquei atônito diante da imagem.

Surpreso, feliz. Com medo. Mas, ia lhe dizer:

— Não sei dançar.

Você acenou para que eu nada dissesse.

Insistiu no o convite à dança. Estendeu a mão,e pude ouvir sua voz, como num sonho.

— Nasceu o Menino Deus. Venha festejar. Bem-aventurados os que vêm em nome do Amor.

É o que lhes desejo – e peço – amigo leitor.

Bem aventurados os que ainda hoje – 2007 anos depois – vivem para celebrar o Amor. Serão estes, os contemplados pelo Filho de Deus que se fez Homem e, neles, renasce a cada manhã…

Feliz Natal. Bom ano para todos…