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Crônica/saudade: Adoniran

O Adoniran disse que mulher, patrão e cachaça em qualquer canto se acha.

Eu não pensava assim.

Tanto que, com a corda mi do meu cavaquinho, fiz uma aliança pra ela. Prova de carinho.

Só que eu não pude ficar nem mais um minuto.

E lhe disse:

— Sinto muito, amor. Mas, não pode ser.

Ela, então, me olhou com um olhar que mata mais do que bala de carabina, que veneno estriquenina, que peixeiro de baiano.

Logo entendi o que me esperava, e retruquei ao vento:

“Bom dia, tristeza. Que tarde, tristeza. Você veio hoje me ver”.

Por sorte, logo encontrei o Arnesto que me convidou para um samba. Ele mora no Brás.

Era uma tarde chuvosa. Tanto que ele me disse em um italiano macarronico:

“Piove, piove. Fa tempo que piove qua…”

Me empolguei, mas não muito. Além do tempo ruim, o Arnesto tem fama de furão.

Ademais, sei onde o Arnesto mora. Já fui lá e dei com o nariz na porta. Nem um recado havia. Naquela noite, fiquei olhando as mariposas que quando chega o frio ficam dando volta em volta das lâmpadas para se esquentar.

Outro amigo, o Joca, tentou me confortar:

— Deus dá o frio conforme o cobertor.

É você tem razão, eu disse.

Meu coração não é uma tábua de tiro ao alvo.

E, de lembrança daquela desalmada, guardei as meias e os sapatos.

Iracema, eu perdi o seu retrato.

*Crônica/saudade para lembrar Adoniran Barbosa que morreu em 23 de novembro de 1982. Aos 70 anos.