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O que o TEMPO leva… (O título)

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Foto: Arquivo Pessoal

Tonico Marques, o Marcão, nosso chefe e guru na velha redação de piso assoalhado e grandes janelões para a rua Bom Pastor, dava o toque e o retoque:

“O título da reportagem deve aparecer, claro e objetivamente, nas três primeiras linhas do texto. Ok?”

“Em último caso, aceito que apareça no lead (o primeiro parágrafo da matéria). Ok?”

Diante do embasbacado silêncio dos aprendizes de repórteres (eu, inclusive e principalmente), sacramentava:

“Se não for assim, tem algo de errado como  o título ou com o texto ou com os dois – e, principalmente, com o desorientado autor da reportagem.”

Ralei que ralei zilhões de vezes para atender à lição básica do Marcão.

Não eram lá um primor os títulos que fazia, mas dei minimamente conta do recado.

Devagar – e sempre.

Sinceramente, não sei se ainda hoje a regra do saudoso Marcão está valendo para o novo_velho_ jornalismo que se pratica nas mais diversas plataformas.

Tem dia que o texto é o título de tão curto que é.

Tem dia que é preciso usar lupa para achar a informação que deu origem ao título em meio a tantas letrinhas desconexas.

E, muitas vezes, o título é só uma pegadinha, nada a ver com a essência e o texto da reportagem.

Tudo em nome de cliques a mais.

Olaia…

Salve a modernidade.

Confesso que ainda hoje hesito na escolha do melhor título para as bobagens que escrevo.

Às vezes, acerto.

Outras, nem tanto.

Quando a coisa aperta, e não sei pra onde vou, apelo para o básico, o núcleo.

“Entre um adjetivo e um substantivo, prefira sempre o segundo” – outra oportuna lição do Marcolino.

Se para reportagens, entrevistas, crônicas, posts e afins, eu já me embaralho, imaginem, os caríssimos leitores, o que sofro para dar nome a um livro.

É um perereco!

Vou e volto e volto e vou de novo…

Dúvida, dúvida, dúvida.

Lá nos pratrazmentes, quando tive a ideia do romance, e comecei a escrevê-lo, nominei o arquivo como ‘O Ator’ na memória do velho notebook.

Não sabia que título teria a minha suposta divagação literária, mas sabia que o ator (no caso, o personagem Carlos Artúlio) seria o personagem central, o núcleo da narrativa.

Talvez – não tenho certeza – minha primeira opção de título foi essa. O Ator.

Não sei…

Anos e anos depois, quando encontrei a pasta com o rascunho da improvável obra, o outro personagem (Felisberto, o dublê de motorista e filósofo) já havia se assenhoreado de parte do entrecho sem que eu me desse conta.

Grafei na primeira página dos escritos, por algum motivo que me escapa:

O Ator & o Filósofo

Muito provavelmente, e sem que eu conscientemente tenha batido o martelo, andasse por aí a minha segunda opção de título.

Não fugiria muito desse escopo, creio.

Volto à velha redação.

Lembro outro saudoso amigo, o Ismael Fernandes, escritor e colunista de TV, dos melhores que conheço.

O sonho do IF era participar de um programa da TV Globo que se chamava “8 ou 800”.

Era o que hoje chamam de Quiz.

O apresentador era o ator Paulo Gracindo; a partner, a lindíssima Sílvia Bandeira – e quem se candidatasse deveria responder tudo sobre determinado tema.

Toda semana, o incauto era bombardeado por uma penca de perguntas – e, se acertasse, chegava mais perto do prêmio milionário.

O estilista Clodovil arrebentou a boca do balão, faturou uma grana, ao responder sobre a vida de Dona Beja, intrigante personagem da História do Brasil.

Ismael se inscreveu – mas, não foi chamado – para discorrer sobre o filme E o Vento Levou…

Um clássico do cinema épico americano, tem quatro horas de duração.

Ele era apaixonado na Vivian Leigh, a protagonista.

Na redação, na padoca, na carona que nos dava (pois, era o único que tinha carro), fosse onde fosse, o Ismael nos contava tintim por tintim sobre a ficha técnica, os bastidores das filmagens, a história do roteiro, quem era quem na trama e na vida real, os figurinos, as locações etc etc etc.

Ele sabia tudo.

Vez ou outra, um de nós, a título de provocação, fazia a única pergunta que o embaraçava:

“Mas, e aí, Isma, o que exatamente o vento levou?”

Ele não perdia a pose. Sequer percebia o tom da nossa brincadeira.

Entabulava mil e um argumentos.

Tergiversava.

Mas, objetivamente, não tinha como nos responder.

Insistia para que a gente entendesse que o filme tratava da inefável passagem do tempo.

Há coisas na vida – explicava – que permanecem, mesmo que aparentemente acabem.

“São eternas, entendem?”

Não, naquela altura das nossas vidas, ninguém entendia.

Como dizia o Marcão, com alguma nostalgia, éramos “jovens e inconsequentes”.

Ano passado, um ou dois dias antes de postar o primeiro capítulo do folhetim, andava às turras com o nome.

Nada me convencia.

Simultaneamente, ouvia e selecionava as músicas para ilustrar os posts.

Nesse arremedo de trilha sonora, incluí a dolente Vambora, de Adriana Calcanhoto.

A melodia se pôs a tocar enquanto eu rabiscava qualquer coisa em busca do sonhado título:

Entre por essa porta agora
E diga que me adora
Você tem meia hora
Pra mudar a minha vida
Vem, vambora
Que o que você demora
É o que o tempo leva

Não esperei a música terminar.

Tive a convicção:

Achei o título.

Taí. No lead… ops, no primeiro verso da canção:

O que o tempo leva…

 

 

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