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Recordações de um velho repórter

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Rodolfo, cadê você?

Martinho da Vila

Imaginem o tamanho do meu sorriso ao receber o disco autografado das mãos do repórter que me substituiu na coletiva de imprensa do cantor e compositor Martinho da Vila nos idos dos anos 80?

Na velha redação de piso assoalhado e grandes janelões para a rua Bom Pastor, alguns duvidaram da legitimidade da dedicatória.

Eu mesmo, passada a surpresa inicial, ponderei comigo mesmo:

Aposto que a iniciativa da coisa toda partiu do amigo e assessor de imprensa da RCA Victor, o inesquecível Artúlio Reis. Não comentei com ninguém, mas, reconheçamos hoje, faz todo o sentido.

Do nada, o notável sambista ia dar por minha ausência em meio a tantos iguais da reportagem?

Coisa do Artúlio.

Ou não?

Lembrei essa história, dia desses, numa conversa com amigos.

Todo ano, Martinho fazia um disco novo, repleto de sambas maneiros, e vinha para São Paulo fazer o lançamento oficial na metrópole, com show no Palace ou no Olympia. Na terça ou na quarta imediatamente anterior à noite da estreia, havia a coletiva de imprensa – e eu lá, caneta e bloco de anotações nas mãos, a ouvi-lo falar do novo trabalho e , sobretudo, das belezas infinitas deste Brasil acolhedor e multirracial.

Naquela tarde, eu me embananei no ‘fechamento’ da edição e não consegui me desvencilhar do compromisso de por o jornal na rua.

Outro repórter foi no meu lugar.

Enfim…

Menos mal que ganhei o disco, mas perdi a preciosa oportunidade do encontro. Sempre culturalmente enriquecedor.

Seja no palco, seja na vida real, Martinho é o mesmo.

Simpático, malemolente, suave no jeitão de tocar a conversa, com sabedoria. Devagar, devagarinho…

Não se iludam, com o jeitão despojado do sambista, Martinho é um homem culto, antenado nas coisas do Brasil e do mundo.

Adora historiar sobre as raízes de seus ancestrais.

Fala sem ranço algum, mas com plena consciência das lutas e das conquistas.

Houve um ano em que ele e outros artistas fizeram uma temporada de shows na África, percorreram diversos países – e Martinho voltou maravilhado.

Dizia algo assim:

África e Brasil são muito parecidos.

Salve a miscigenação das raças.

Somos um povo lindo.

Temos em comum o “desafio de construir um futuro de paz.”

#JustiçaParaMoise

Acompanho o noticiário sobre Moïse Kabagambe, 24 anos, originário do Congo. Ele foi brutal e covardemente assassinado após cobrar duas diárias de trabalho no quiosque Tropicália, na Barra da Tijuca.

Há 30, 40 anos, quando entrevistei Martinho e outros tantos nomes da MPB, me parecia natural que a Humanidade e nós, brasileiros, livres do arbítrio e da opressão, enveredaríamos pelos sacrossantos caminhos de paz, fraternidade, harmonia e justiça social.

Não imaginei que tamanha barbárie fosse possível.

Vivíamos os estertores do século 20 e abençoávamos a chegada da Era de Aquarius.

Hoje me dou conta de que Martinho deu um ênfase especial à palavra “desafio”.

Ou seja a construção desse futuro de paz, a bem da verdade, sempre foi – e continua sendo- tarefa de todos nós.

#JustiçaParaMoise

1 Response
  • Jacqueline
    4, fevereiro, 2022

    #JustiçaParaMoise

    É isso.
    A busca pela paz é tarefa para todos nós.

    Lindo texto!

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