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Triste momento do jornalismo brazuca

Os repórteres entrevistavam o então governador de São Paulo, Paulo Maluf (1979/1982), que, como de costume, tergiversava sobre diversos temas a escapar da saraivada de perguntas que os jornalistas lhe faziam.

Falava, falava, falava…

II.

Bem à frente dele, a repórter Maria Regina Curuci observava atentamente o que Maluf dizia. De bloco e caneta na mão, nada anotava, porém.

Os demais profissionais perceberam a estratégia, e naturalmente adotaram o mesmo procedimento. Cruzaram os braços, e também se posicionaram, digamos, em sinal de protesto pelo embromation do doutor.

Ao perceber a cena, Maluf não teve dúvidas. Cortou a fala e se dirigiu à Regina e a questionou:

– Anote aí, moça, anote aí!

A resposta veio no mesmo tom.

– Quando o senhor responder a pergunta que lhe foi feita, eu anoto.

III.

Lembro o fato, e lamento o triste momento que vive hoje o jornalismo brasileiro. No exato período em que dele se espera independência, o respeito à verdade factual e, sobretudo, a equidistância dos graves fatos políticos que hoje ocorrem e que deveriam relatar, com parcimônia e clareza, à opinião pública.

IV.

Assisti na noite de segunda-feira ao programa Roda Viva em que o entrevistado da noite foi o ex-deputado Roberto Jefferson.

Qual o fato marcante que pautou a escolha do entrevistado?

Talvez sua proximidade ao vice-presidente Michel Temer?

Não sei.

Sei que em meio às platitudes que disse – já se entendendo um dos mentores do novo tempo, pós Dilma – Jefferson disse que “movimento popular é coisa de bandido”. Alertou, inclusive: já havia conversado com o amigo (Temer) para enviar uma lei para nosso combativo Congresso que ‘enquadrasse’ essas mobilizações. Imagino que ele se referia aos movimentos de esquerda. Os da turma do Skaf, creio, seriam tolerados e, suponho, até bem-vindos.

V.

Não me surpreendeu à inclinação ao estado de exceção do douto entrevistado. Na hora, o que me deixou decepcionado foi o silêncio cúmplice dos jornalistas presentes. Mais desalentador ainda foram as perguntas que vieram a seguir, sempre em tom de promovê-lo como um dos ícones da política nativa.

Uma delas:

– Deputado, como foi reencontrar sua filha no Congresso depois de tantos anos sem ir à Brasília?

VI.

Dias depois, também vi a cena na TV, o vice-presidente Michel Temer a explicar o acidente que resultou no vazamento do áudio em que ele já fala e se entende como ocupante da cadeira presidencial. Usou desculpas e argumentos pífios, amplamente discutíveis.

Na roda de repórteres que o entrevistava, nenhuma pergunta. Nenhum questionamento. Nenhuma pergunta sobre traição, conspiração, conluio.

Talvez seja delírio da minha parte. Mas, os jornalistas me pareceram satisfeitos com as toscas falas que ouviram.

VII.

Remoo minhas pálidas convicções sobre os pilares do bom jornalismo. Assalta-me a ideia de que há um novo tipo de Imprensa em prática. Algo que obrigue o profissional a ser subserviente e agradável a quem é agradável aos interesses dos Senhores da Mídia. Estes, por sua vez, são subservientes e agradáveis a interesses outros que esta ou aquela fonte possa vir a representar.

É assim que gira a roda viva dos nossos dias. Infelizmente gira para trás…