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Um domingo qualquer

É sempre um bom assunto para o cronista o silêncio da cidade nas primeiras horas da manhã de um domingo qualquer.

Da janela do apartamento no décimo nono andar onde mora, ele pode descrever o cenário de céu carregado, cinzento e da neblina que, ao fundo, ameaça engolir a silhueta de prédios a salpicar diante dos seus olhos.

Enquanto inspeciona os arredores, o cronista lembra as vezes que lançou mão deste artifício para salvar o dia e vencer o desafio da tela em branco.

Perdeu a conta…

II.

Atenta para o carro que percorre a avenida, solitário, e alcança a alça de acesso à via Anchieta com destino a São Paulo. Isso o faz lembrar os tempos em que trabalhava na Capital, também nos finais de semana.

Sempre soube que o Jornalismo impõe esse tipo de jornada. Não é lá uma profissão comum. Mas, por vezes, a nhaca era incontrolável.

No trajeto entre a casa e o jornal, resmungava que resmungava a lamentar a folga que o mundo todo tinha – e ele, não.

Uma invejinha tola, desenfreada.

Essa turma de folgados pode fazer o que quer do seu dia, pensava. Encontrar os amigos, ver o futebol, ir ao shopping ou simplesmente deixar-se estar junto ao balcão de um boteco sem eira, nem beira.

III.

Às vezes, em dias mais ensolarados, dava vontade até de imitar o vizinho que lavava o carro diante do seu portão tranquilamente e, quando lhe via sair, o cumprimentava educadamente:

– Bom dia, vizinho. O trabalho enobrece o homem.

Tinha uma ironia ali. Mas, ele desconsiderava. O homem não era má pessoa. De resto, sempre odiou a brincadeira de ficar esfregando a lataria de um automóvel.

A liberdade de se fazer o que se bem entender era o motivo do desalinho pessoal.

IV.

Essas aflições todas, no entanto, e é bom que se diga, terminavam quando o cronista chegava à Redação. Ali, ele entrava no mundo dos iguais. O frenesi de correr atrás da notícia – naqueles idos, lugar de repórter era na rua – o fazia sentir um privilegiado.

(Não foi à toa que escolheram o disfarce humano do Super-Homem como Clark Kent, o repórter.)

A gente não via o tempo passar. E a musiquinha do Fantástico era só a musiquinha do Fantástico, e não o prenúncio de uma modorrenta segunda-feira.

V.

Me dizem que hoje, em algumas cidades, é dia de eleição municipal – segundo turno. Havia até esquecido. Não sinto a menor saudade da lida.

As redações não são mais as mesmas…