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Aonde vamos parar?

01. Ele me parou na rua para pedir explicações sobre mundo. Idade imprecisa, entre os 40 e muitos e os 50 e poucos, queria saber o que estava acontecendo, pois já não era menino e cada vez entendia menos a tal sociedade que vivemos. "Os jornais falam muito, escrevem muito e não informam o que a gente precisa realmente saber", disse em tom de cobrança. E todo o dia vem uma enxurrada de fatos novos, previsões nebulosas, interpretações catastróficas. É violência e mais violência. "Onde vamos parar?", perguntou. "Ninguém dá valor à vida humana. É o fim do mundo!"

02. Tentei uma primeira explicação, mas fiquei só na tentativa. O meu novo amigo (e ao que tudo indica assíduo leitor) estava indignado — e com a corda toda. "Veja o caso do ator da Globo que foi estupidamente baleado numa estrada paulista. Que coisa mais absurda, desumana… E ainda ouvi numa emissora de rádio o secretário da Segurança dizer que não se pode viajar à noite… De madrugada, então, nunca. Em última análise, é conveniente que se forme uma espécie de comboio… Ora, meu Deus do céu, esse senhor tem mais que tratar de policiar mais as estradas, assumir a sua responsabilidade e, por que não?, até a sua culpa pela violência generalizada que se vê pelos quatro cantos do Estado…"

03. Entendo perfeitamente o desabafo do amigo. E chego a insinuar que essa fobia urbana é inerente à vida moderna, ao dia-a-dia das grandes metrópoles, à competição que se enfrenta em cada passo rumo ao que se entende como realização profissional. Nossa vida pessoal anda meio esquecida, não é? — pergunto meio que sem querer… Ele nem me responde e continua no mesmo mote. "Olha, companheiro, o caso do Gerson Brenner só teve o espaço que teve porque ele é artista de novela. Diariamente os distritos policiais registram casos iguais e, se é que se pode dizer, até piores. Infelizmente… Chacinas, latrocínios, maníacos… Ainda agora, manhã de quinta-feira, chega a notícia de um assalto com morte nas imediações da Tancredo Neves. Quanta aberração! Será que a gente tá deixando de ser gente?"

04. Não sei, não. Mas, que as pessoas andam estranhas não resta a menor dúvida. Essa bronca toda faz sentido e, acredite, não é só você que se assusta diante desse irracional endurecimento do ser humano. De olho nas almejadas conquistas materiais, todos nós, que nos incluimos entre a elite pensante deste País, acabamos por privilegiar o individual no lugar do coletivo — e isso, mais a inépcia dos governantes que se sucederam, mas não se renovaram, acabou gerando esse calamitoso estado de coisas.

05. Lembro que, pelos idos dos anos 70, o jornalista Mino Carta escreveu sobre a perda da identidade cultural da classe média brasileira. Ele antevia problemas graves a médio prazo para os grandes centros, que estavam sendo tomados por bolsões de miséria vindos dos quatro cantos do País. Esse contingente de desvalidos só tenderia aumentar diante de nosso olhar de suposta superioridade e das mazelas daqueles que tudo lhes negam e nos nos representam no Congresso Nacional. Sem as condições mínimas de sobrevivência (saúde, educação, emprego, habitação…), acabariam por se rebelar. É a guerrilha urbana que ora vivemos. Uma luta sem pátria, sem ideologia, sem porquês. É o que hoje vivemos, lamentavelmente…