É uma moça bonita, de ares fugidios, que ontem me procurou.
Veio me falar do talvez e do nunca, ameaças que involuntariamente podem ou não amarrar a vida de todos nós.
Eu lhe disse: depende.
E ela me falou de um filme que assistiu. E a impressionou.
Tratava da loucura que há em uma noite escura. Havia uma canção que ela cantarolou baixinho, e brevemente.
Tem pinta de filósofa, de cabelos escorridos até os ombros. Mas é só uma menina que, por vezes, reluta em voltar para casa.
Não soube o que lhe dizer.
Filmes e canções sempre me impressionam. Lembram coisas, deixam marcas, dizem o que ficou por dizer. Ou não tive oportunidade e/ou coragem de falar.
Enfim…
Para não morrer o papo lhe contei que, por certo tempo, lá no mais antigo dos anos, trabalhei em uma revista que se chamava Afinal. Tinha a pretensão de enfrentar a Veja e, para tanto, contratou os melhores jornalistas do mercado.
Como as coisas não saíram como o desejado, os salários começaram a atrasar – e boa parcela desse pessoal saiu. Foi nessa hora que eu cheguei – ou seja, não estava entre os melhores, mas corria atrás.
Queria escrever. E foi uma porta que se abriu.
Certa tarde, cheguei à redação ali, na rua Maria Antônia, e o editor de Cultura me passou a seguinte pauta:
– Você (eu) tem duas páginas para falar da obra do escritor argentino Jorge Luis Borges, que acaba de morrer.
Não havia o Google.
Ele, então, me entregou duas pastas enormes com recortes sobre o autor. Liguei para dois ou três críticos de literatura — e de madrugada comecei a fazer o texto que ficou legal, está no meu primeiro livro.
Descobri que Borges era genial. Um frasista, de primeira. Por meio de seus pensamentos escritos, definia a vida e o viver.
Um deles me é inesquecível:
"A gente pode tudo nessa vida. Só não pode é se fazer infeliz."
Não sei o porquê fui lembrar dessa história naquele momento. Suponho que gostaria que a moça entendesse essa verdade em meio a tantas divagações. De tão simples, é uma verdade difícil de ser entendida, e vivida. Quando nos fazemos felizes o nunca e o talvez desaparecem, mesmo que por instantes que se fazem eternos.
E isso é o que vale.
Como diz aquela velha canção que o rádio esqueceu-se de tocar:
“Ser feliz é tudo o que se quer.”
FOTO NO BLOG: Camila Bevilacqua