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Relatos de um viajante parvo (3)

(Continuação)

IV.

Ninguém virgula.

Um casal de motociclistas – digo motociclistas, pois ambos traziam um capacete enfiado em um dos braços, como se fosse uma desproporcional pulseira – interrompeu o périplo pelo santuário ao perceber a cena.

O homem dirigiu-se, então, em passos firmes ao lugar onde estava o sofredor. A mulher permaneceu a certa distância, com pequeno rosário entre os dedos de uma das mãos.

Ao se aproximar, ele estendeu o braço direito e tocou levemente o alto da cabeça do outro que, segundos depois, se aquietou, como por encanto.

Ficaram assim por minutos.

Como se um abençoasse o outro.

Como se unissem em um único leve sussurrar suas mais sinceras orações.

Houve ali um pacto, creio.

Uma manifestação de fé e de amor ao próximo.

Uma brevíssima visão do Mistério.

V.

Sem qualquer outra palavra, o motociclista se afastou.

Tinha o semblante sereno de quem cumpre uma missão.

E assim, como se nada houvesse acontecido, continuou seu roteiro ao lado da companheira.

O templo voltou a ficar em silêncio.

Só era possível ouvir os passos dos visitantes e, vez ou outra, o espocar do flash de alguma máquina fotográfica.

VI.

Eu estava prestes a deixar a Abadia quando vi o homem – antes transtornado – levantar-se calmamente. Vestir o casaco de bom talho, aprumou a mochila nas costas, persignou-se diante do altar e saiu pleno de paz.

Podia ser qualquer um de nós, pensei.

E eu, que nem rezar direito sei, murmurei trecho do Sermão da Montanha (Matheus, V, 1-12):

“Bem aventurados os que choram, porque eles serão consolados…

“Bem aventurados os pacificadores, porque eles serão chamados Filhos de Deus…

“Bem aventurados os limpos de coração, porque eles verão a Deus…