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Reféns de uma Guerra perdida

"O pior pecado contra nossos semelhantes não é o de odiá-los, mas de sermos indiferentes para com eles" (Bernard Shaw)

01. Os números são aterradores, e não deixam qualquer dúvida sobre a extensão da tragédia brasileira. De 1979 até o último dia 30, mais de meio milhão de assassinatos ocorreram no País, concentrados nos grandes centros urbanos. A área metropolitana de São Paulo é a região mais crítica, de acordo com as estatísticas dos ministérios da Saúde e da Justiça. O número exato bate em 578 mil mortes; 48 mil registradas só no ano passado. Nos primeiros seis meses do ano, as estimativas (ainda em fase de tabulação) dão conta de, pelo menos, 20 mil ocorrências. A continuar nessa triste toada, é possível que cheguemos ao novo milênio com a deplorável marca de 600 mil homicídios. Para o sociólogo Túlio Khan, que estuda a criminalidade para a Organização das Nações Unidas, somos hoje reféns de uma guerra perdida.

02. Parece-me importante — e oportuno dizer — que esses números, repito, aterradores sejam divulgados justamente agora. Começou ontem oficialmente a campanha de candidatos a prefeito e a vereador — e logo, logo um contingente inefável de paladinos do bem e da justiça vai invadir nossos lares, com os discursos absolutamente originais em suas mesmices. Todos são absolutamente honestos, com bons propósitos e estão dispostos a lutar heroicamente em nome da causa pública. É por aí a ladainha… Uns terão mais dinheiro para gastar, e farão campanhas caríssimas. Outros vão se virar com o que têm e podem. Acima de todas as questões, já se ouve dizer que o momento político transcende à simples eleição na esfera municipal. As cúpulas partidárias, a bem da verdade, jogam suas cartas, especialmente nas grandes capitais, com olho vivo em 2002, quando elegeremos presidente e governador. Por isso, os acertos, alianças, apoiamentos e chapas (tenham lá o nome que tiver esses conchavos políticos) foram pensados e repensados como um intrincado jogo de xadrez, onde nós, pobres peões, ficamos outra vez na linha de frente; mas, fora do jogo…

03. O Poder pelo Poder é o equívoco secular da elite mandatária do País. E a íntegra do primeiro parágrafo revela o tamanho da nossa dívida com o social. Como ela se agravou e para onde vai nos levar, se todos continuarem inertes, querendo tirar proveito único do caos. E, olhe, nem falo do avanço da miséria nacional, da perda de nossa identidade cultural (o que nos achata enquanto povo e Nação), da crise de autoridade dos atuais governos municipal, estadual e federal (quem acredita em Pitta, Covas e FHC?) e da absoluta subserviência da mídia invertebrada que faz o que pode para satisfazer o Sistema e se transformar em parte dele (basta ver a manchete de um grande jornal que anunciou solenemente: "A inflação do semestre é a menor desde 39". Você e o seu bolso acreditam nisso?)…

04. A hora é de objetivos claros e de atitudes precisas. Quem concorre a prefeito ou a vereador deve mesmo pensar em fazer o melhor e trabalhar pela cidade. Dispensa-se a discurseira. Dispensa-se também a proposta de que temos projetar um futuro melhor. Se não resolvermos o hoje, com sensatez e coragem, pode acreditar, caro leitor, não vai sobrar nada para o amanhã…

05. E é bom que comecemos desde já a fazer valer nossa cidadania. Vamos ficar atentos aos candidatos, aos discursos e propostas; mas principalmente à história de vida de cada um. Já cansamos de eleger matilhas de lobos em pele de cordeiro, e nos demos mal. Outra boa iniciativa é estarmos presentes hoje, às 19 horas, na Praça da Sé, onde se realiza a manifestação "Basta! Eu Quero Paz", movimento não-governamental que discute e combate a violência. Um dos coordenadores, Denis Mizne, foi enfático na sua argumentação: "não estamos assustados porque assaltaram a casa do nosso vizinho. Estamos perplexos porque morrem 50 pessoas por fim de semana" — e a sociedade parece que se acostumou à essa tragédia.