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O tucanês da reeleição: É dando que se recebe

"Junto com a voz rouca das ruas, os deputados estão ouvindo os murmúrios dos cargos". (Deputado Moreira Franco sobre os votos pró- reeleição).

01. Não se iluda, amigo. O nhem-nhem-nhem da reeleição não se esgotou nesta semana, com a aprovação da emenda na Câmara Federal. Foi apenas o primeiro turno. Um repeteco do que se viu nesta terça vai acontecer entre 17 e 28 de fevereiro no mesmo plenário. Depois, em março, é a vez do Senado julgar a questão. Entre 4 e 13, votação em primeiro turno. De 13 a 31, o segundo turno e a promulgação da Lei que vai permitir a reeleição para presidente, governador e prefeito em todo o País. O presidente está feliz. A vitória foi arrasadora: 336 votos a favor, 17 contra e seis abstenções. A oposição — ou o que restou dela — fala em virar esse placar. Mas, não há convicção em suas palavras. A máxima do ex-ministro Roberto Cardoso Alves (falecido em 95, num acidente na Castelo Branco) continua em pleno vigor em Brasília: "É dando que se recebe… ". Acho oportuno lembrar que, entre os principais críticos do estilo Robertão, sempre esteve o PSDB de Mário Covas e Fernando Henrique. Nada como um dia após o outro.

02. Há quem comente que a indiscutível vitória nas urnas em 3 de outubro de 1994 mudou as convicções do então senador Fernando Henrique Cardoso sobre o assunto. Ainda antes da posse, ele ouviu as primeiras perguntas sobre reeleição e procurou responder com evasivas. Afinal, em ocasiões anteriores, havia se pronunciado irredutivelmente contrario (até porque o fantasma de Lula presidente rondava ameaçadoramente os arredores do Planalto). No entanto, em fevereiro de 95, surgiu a primeira proposta sobre o tema e, desde então, o Brasil nunca mais foi o mesmo. Prioridade em toda e qualquer conversação do Governo e a seu pedido, a reeleição ganhou uma comissão especial na Câmara em outubro do mesmo ano. Começaram, então, a caça aos votos e a barganha entre os parlamentares. O maior entrave, quem impôs foi o PMDB. Que, ao final, como é de seu feitio, não resistiu aos acenos e favorecimentos do Governo. E o sonho de um homem só está preste a se tornar realidade.

03. Enquanto essa casta de privilegiados brinca de ser feliz e anuncia um admirável mundo novo, a gente vai contabilizando os dissabores nossos de cada dia. Dá para entender que eles continuam os mesmos e estão pouco se lixando para nós. Para o que queremos, para o que precisamos. Democracia tem desses percalços. O melhor é que estamos vendo e aprendendo. Em 98, saberemos distinguir quem é quem. Quem vislumbra os verdadeiros interesses da Nação e quem apenas olha para o próprio umbigo e passa todo o mandato legislando em causa própria.

NR.: O Brasil, que reverenciou, semana passado, o 100º aniversário do jornalista Barbosa Lima Sobrinho, o eterno vigoroso presidente da Associação Brasileira de Imprensa, lamentou a morte na quarta-feira do jornalista e escritor Antonio Callado, aos 80 anos, no Rio de Janeiro. "Quarup", seu romance mais conhecido, retratou a inquietação dos anos 60, quando se acreditava que o sonho era possível e a revolução inevitável. Mais tarde, escreveu "Bar Don Juan", onde revela o desencanto com o ideário das mudanças, fundamentalmente por não acreditar nos homens que tanto se auto-proclamavam de revolucionários. Qualquer semelhança com os fatos atuais acredite, caro leitor: é a dura realidade.