UMA NOVELA BLOGUEIRA – (Foto: Arquivo Pessoal)
Lorotas de um aloprado contra-regra e a revelação do palpitante romance, aquele que é sem ainda nunca ter sido…
Foi num desses êxtases que o Sr. Camargo flagrou todo o lance.
Entendeu o ululante do óbvio: a morena Lucilinda e o catatônico funcionário caidaço por ela.
Que história!
Maldoso que só.
Bateu uma invejinha, creio.
…
Acontece que, além de dono do Gera Park Estacionamento, o Sr. Camargo era um inescrupuloso gozador, daqueles que se dispõe a perder o amigo (no caso, o funcionário) para não perder a piada.
Embicando na curva derrapante dos 60, o tal é cheio de contar causos.
Guarda um jeito moleque de sacanear quem quer que seja.
Quem o conhece mais à vera diz que não faz por maldade e, sim, por instintiva diversão.
“É das antigas, não reparem, do tempo em que não havia o politicamente correto”.
Trouxe este, digamos, pecadilho dos anos em que trabalhou de contra-regra na TV, nem sequer havia videotape e se fazia teleteatro na unha, ao vivo.
…
Todos na turma – inclusive o Felisberto – já sabiam de cor e salteado a lengalenga sobre o dia em que Camargo aprontou pra cima do grande Procópio Ferreira, então o ator número um da dramaturgia brasileira, aclamado e festejado até no continente europeu.
“Morava numa mansão, ali, perto do Jóckey Club” – cheio de querer mostrar intimidade.
Ah, esse Sr. Camargo é bom de conversa.
…
A história é a seguinte, vou lhes satisfazer a curiosidade:
O personagem de Procópio Ferreira teria que, em cena, assassinar a mulher amada com dois tiros. Era o ápice da noite. TV ao vivo, como lhes disse, não permitia erros. Procópio, idem. Tomado de incontrolável ciúmes, o ator retiraria o revólver da gaveta de um dos móveis do cenário e… bam! bam!… mataria Cleide Yaconis. Ou seria Lolita Rodrigues. Talvez fosse a Hebe Camargo. Ou mesmo a própria filha, Bibi Ferreira.
Nesse ponto, Sr. Camargo sempre muda o nome da atriz.
Nosso indigesto contra-regra distraiu-se. Esqueceu e não colocou a arma no lugar combinado. E o grande Procópio não teve dúvidas. Tomado pelo fervor que a cena pedia – e com ganas de trucidar Camargo -, colocou dois dedos em riste mais o polegar para cima e acionou o imaginário gatilho… bam!bam!…executou Márcia Real. Ou seria Natália Thimberg, talvez fosse a Laura Cardoso.
A coxia veio abaixo, tamanha gargalhada.
A cena marcava o fim do segundo ato. Nunca ficou provado, mas é bem provável que o episódio determinou o adeus à promissora carreira televisiva de Camargo. Aliás, sempre que narra essa história, além de mudar o nome da atriz (“Acho que foi minha comadre Sonia Ribeiro?”), ele se autoproclama um injustiçado:
– Queiram ou não, merecia outra oportunidade. Afinal, protagonizei um dos clássicos do improviso da TV brasileira.
…
Disposto a divertir-se como nos idos tempos, o Sr. Camargo ficou maquinando como poderia tirar proveito da situação.
Sábado à tarde seria uma boa ocasião, pensou.
Os marmanjos vão jogar um futebol-society e depois seguem para o Gera Park.
Lá no fundão armam a churrasqueira e comem e bebem e se espalham num papear até a madrugada de domingo. Bando de avulsos, sem famílias…
Pagode, não. A vizinhança reclama do batuque.
Nem precisaria, a atração já está programada:
“Vamos zoar o Felisberto Carreiro.”
…
O que você acha?