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Breve memória de um homem barbado (2)

IV.

Quando adentrei (gostaram do termo?) à velha redação de O Diário da Noite (minha primeira experiência na área, e que durou breves semanas), notei que alguns dos meus futuros ex-colegas já exibiam sinais de, digamos, fadiga de material: ternos mal-ajambrados, gravatas afrouxadas no colarinho e barba de dias por fazer.

Não inspiravam um futuro promissor para qualquer jovem repórter.

Também pudera…

O jornal caminhava para o inexorável fim. Os sinais de decadência eram visíveis e, imagino, alguns dos valentes profissionais que lá estavam já presumiam o que lhes reservava o destino.

Eu não era exatamente “um playboyzinho”, como se dizia então. Mas, gostava de uns panos diferentes e usava (ê saudade!) cabelos mais cumpridos. Ainda estranhava quem deixasse a barba crescer ou mesmo exibisse um cavanhaque (barba de ponta, como se diz em Portugal), tipo Raul Seixas.

“Muito esquisito”, disse, certa vez, ao Zezinho, um amigo gozador, sobre a aparência do Maluco Beleza.

Zezinho trabalhava como digitador no jornal e não perdoou meu comentário.

“Esquisito é comer macarrão com arroz”.

V.

Quando comecei a trabalhar em Gazeta do Ipiranga, tomei um susto danado ao ser apresentado para um dos proprietários, o jornalista Tonico Marques (o inesquecível, Marcão). Na ladeira dos sessenta e poucos, fazia o estilo despojado para um executivo – calça rancheira, camisa aberta ao peito e um indefectível boné de jeans a equilibrar na cabeça.

Achei superbacana e, definitivamente, aposentei o conceito do vô Carlito chapéu/boné/homem/menino.

VI.

Comecei a pensar em deixar a barba crescer quando me dei conta de que enfrentar o espelho todos os dias era chato demais.

Não foi uma decisão consciente.

Mas, sim, uma largação natural. Deixei de fazer a barba um dia, depois dois, depois só dava um tapa no fim de semana até que…

Outro fato inspirador foi ver Afonsinho, volante do Botafogo e do Santos, em campo a exibir barba e cabelos cumpridos e desgrenhados. Afonsinho era um craque – o primeiro rebelde do Planeta Bola/Brasil. Queria ser livre – e era. Jogou a Lei do Passe no ventilador.

Desconfio, cá com meus botões, que foi uma das raras influências de outro barbado incomum, o saudoso Sócrates, o Brasileiro.

•continua amanhã…