Alicinha agora brigava em duas frentes:
1 – conter os libidinosos avanços de Escova e...
2 – segurar o choro de arrependimento.
Que esparrela!
Escova se achando.
O arrependimento.
E a criança que, livre do cadeirão se pôs a correr entre as mesas do restaurante, a comemorar a súbita liberdade em sonoro idioma próprio.
-- Dedéééééé. Dedéééééé...
Escova percebeu que algo acontecia. Mas, não intuiu o tamanho da encrenca.
Os músculos de Alicinha se enrijeceram. Perdera a fome, e a coragem.
E a menina – tão parecida com a sua Mirna – a lhe cobrar uma atitude:
-- Dedéééééé. Dedéééééé...
-- Dedéééééé. Dedéééééé...
-- Dedéééééé. Dedéééééé...
As pessoas às mesas riam da farra da garota.
Os pais continuavam a lida de derrubar a taça de sorvete, indiferentes às peripécias da pimpolha.
Escova, de repente, silenciara. Pressentira que a bola não estava mais com ele.
Só Alicinha entendia o drama que estava vivendo.
Um drama que não resistiria a mais um segundo sequer.
Entre um e outro “dedéééééé, dedéééééé” tomou coragem e disse o que tinha de dizer:
-- Desculpe, Escova, mas o licor fica para a próxima [se houver próxima, pensou.]
Estou morrendo de saudades da minha filha.
Levantou-se, e foi embora.
Acenou para a garotinha:
-- Tchau – e obrigado pela dica.
Como resposta, obteve um sonoro...
-- Dedéééééé. Dedéééééé...
Desconsolado, não coube alternativa ao nosso herói, se não aquela de sempre: entornar o que restou da garrafa de vinho, pagar a conta e afogar o vazio que lhe ia à alma no boteco de sempre. Com os amigos de sempre. Que ouviam solidários as lamúrias de sempre [ainda que debochadamente entendiam a sua dor]. Além do que, sempre havia uma alma generosa para lhe pagar a saideira.
Só não se conformou com o cartaz afixado na parede do boteco, sabe-se lá porque razão. Anunciava o novo filme de Johnny Deep – Diário De Um Jornalista Bêbado.
-- Quem é esse cara?, perguntou com voz pastosa.
-- Essa é a minha história, indignou-se antes de debruçar-se sobre o tampo da mesa e apagar num sono pesado e sem quaisquer sonhos. |